
A chegada de medicamentos genéricos e medicamentos similares no mercado nacional, bem como a prática da intercambialidade pelo profissional farmacêutico, revolucionou o acesso da população à terapia medicamentosa. A concorrência com medicamentos referência impulsionou a redução de preços, beneficiando diretamente os consumidores e facilitando o acesso a medicamentos seguros e eficazes.
A substituição entre medicamentos referência e genéricos ou entre medicamentos referência e similares intercambiáveis é atribuição exclusiva do farmacêutico e pode ser realizada de acordo com o interesse do usuário, salvo de houver vedação expressa pelo prescritor. Ao realizar a intercambialidade, o farmacêutico deve seguir o disposto na legislação vigente, indicar a substituição realizada na prescrição, apor seu carimbo a seu nome e número de inscrição do Conselho Regional de Farmácia, datar e assinar.
Para que um medicamento possa ser considerado intercambiável, este deve necessariamente passar por testes de equivalência terapêutica, que incluem comparação in vitro através dos estudos de equivalência farmacêutica e in vivo com os estudos de bioequivalência apresentados à Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Sendo assim, tecnicamente, os estudos comparativos de equivalência farmacêutica, bioequivalência/biodisponibilidade relativa são realizados entre os medicamentos de referência e os seus respectivos genéricos, assim como, entre os medicamentos de referência e seus respectivos similares para que sejam, então, considerados intercambiáveis.
Dessa forma, há previsão legal para a realização, pelo farmacêutico, apenas da intercambialidade entre medicamento referência e seu genérico correspondente (e vice-versa), conforme previsto na RDC nº 16/2007 e entre medicamento de referência e seu similar intercambiável (e vice-versa), conforme previsto na RDC nº 58/2014. Neste útimo caso, para ocorrer a intercambialidade, deverá o farmacêutico observar a categoria regulatória do medicamento e qual o medicamento de referência, caso este tenha passado por estudos que indiquem a possibilidade de intercambialidade. A consulta dos medicamentos registrados junto à Anvisa, com a informação de sua respectiva categoria regulatória (genérico, similar, biológico, específico, fitoterápico, entre outros) pode ser realizada clicando aqui. Para informações sobre os conceitos e tipos de medicamentos acesse aqui.
Esclarecemos também que devido à ausência de estudos comparativos e norma que preconize e regulamente a intercambialidade entre genérico e similar ou similar entre similar, tal prática não está prevista, permanecendo apenas as possibilidades de intercambialidade acima citadas, independentemente se for medicamento controlado pela Portaria SVS/MS nº 344/98 ou não.
Ressalta-se, entretanto, que devido à sua natureza, determinadas categorias de medicamentos não são admitidas para fins de registro como medicamento genérico ou similar e não podem ser considerados intercambiáveis. Conforme regulamentado pela RDC nº 753/2022, tal restrição se aplica a produtos biológicos, imunoterápicos, derivados do plasma e sangue humano; medicamentos fitoterápicos; medicamentos específicos; medicamentos dinamizados; medicamentos de notificação simplificada; antissépticos de uso hospitalar; produtos com fins diagnósticos e contrastes radiológicos; radiofármacos; gases medicinais; e outras classes de medicamentos que venham a possuir legislação específica para seu registro. Os produtos de cannabis, regularizado junto à ANVISA nos termos da RDC nº 327/2019, não são medicamentos e não há previsão de intercambialidade. De acordo com a norma vigente, a designação de tais produtos deve ser feita pelo nome do derivado vegetal ou fitofármaco acompanhado do nome da empresa responsável.
No caso de produtos biológicos, é importante esclarecer que, ainda que a regulamentação sanitária (RDC nº 55/2010 e RDC nº 875/2024) preveja critérios para registro de medicamentos biossimilares por meio de uma avaliação de comparabilidade, tais medicamentos não são considerados intercambiáveis com o produto biológico comparador devido às possíveis diferenças nas características dos produtos e nas respostas individuais dos pacientes. O assunto já havia sido objeto de esclarecimento pela ANVISA em 2017, por meio da Nota Esclarecimento nº 003/2017/GPBIO/GGMED/ANVISA (https://www.gov.br/anvisa/pt-br/setorregulado/regularizacao/medicamentos/produtos-biologicos/documentos-orientativos-e-guias/nota-de-esclarecimento-003-de-2017-medicamentos-biologicos.pdf/view). A substituição entre produtos biológicos, portanto, não pode ser realizada pelo profissional farmacêutico e dependerá, de avaliação do prescritor e emissão de nova prescrição. Neste caso, a atenção farmacêutica é ferramenta imprescindível para a discussão de alternativas terapêuticas com o prescritor, para a orientação do uso adequado do produto, bem como para a farmacovigilância e acompanhamento pós-mercado desses produtos.
Segue abaixo alguns trechos da legislação vigente, conforme mencionado acima:
RDC nº 16, de 02 de março de 2007 – Aprova Regulamento Técnico para Medicamentos Genéricos.
2. Dispensação
2.1. Será permitida ao profissional farmacêutico a substituição do medicamento prescrito pelo medicamento genérico correspondente, salvo restrições expressas pelo profissional prescritor;
2.3 O medicamento genérico somente será dispensado se prescrito pela Denominação Comum Brasileira (DCB) ou, na sua falta, pela Denominação Comum Internacional (DCI), podendo ser intercambiável com o respectivo medicamento referência. (nova redação dada pela RDC 51/07)
2.3.1 O medicamento de referência poderá ser dispensado quando prescrito pelo seu nome de marca ou pela respectiva Denominação Comum Brasileira (DCB) ou, na sua falta, pela Denominação Comum Internacional (DCI), podendo ser intercambiável com o medicamento genérico correspondente. (nova redação dada pela RDC nº 51/07)
RDC nº 17, de 02 de março de 2007 – Aprovar regulamento técnico para registro de medicamento similar.
2. Dispensação (Incluído pela Resolução – RDC nº 51, de 15 de agosto de 2007)
2.1. O medicamento similar poderá ser dispensado quando prescrito pelo seu nome de marca ou pela respectiva Denominação Comum Brasileira (DCB) ou, na sua falta, pela Denominação Comum Internacional (DCI) correspondente. (Incluído pela Resolução – RDC nº 51, de 15 de agosto de 2007)
2.1. A dispensação de medicamentos no âmbito do SUS será feita mediante a apresentação de receituário emitido em conformidade com o disposto na Lei n.º 9.787, de 1999, e observará a disponibilidade de produtos no serviço farmacêutico das unidades de saúde. (Redação dada pela Resolução – RDC nº 53, de 30 de agosto de 2007)
2.2. É dever do profissional farmacêutico explicar, detalhadamente, a dispensação realizada ao paciente ou usuário bem como fornecer toda a orientação necessária ao consumo racional do medicamento similar. (Incluído pela Resolução – RDC nº 51, de 15 de agosto de 2007)
RDC nº 58, de 10 de outubro de 2014 – Dispõe sobre as medidas a serem adotadas junto à Anvisa pelos titulares de registro de medicamentos para a intercambialidade de medicamentos similares com o medicamento de referência.
Art. 2º – Será considerado intercambiável o medicamento similar cujos estudos de equivalência farmacêutica, biodisponibilidade relativa/bioequivalência ou bioisenção tenham sido apresentados, analisados e aprovados pela ANVISA.
Parágrafo único. A ANVISA publicará em seu sítio eletrônico a relação dos medicamentos similares indicando os medicamentos de referência com os quais são intercambiáveis.
Resolução CFF nº 349, de 20 de janeiro de 2000 – Estabelece a competência do farmacêutico em proceder a intercambialidade ou substituição genérica de medicamentos.
Art. 1.º – É atribuição privativa do farmacêutico, proceder a dispensação e/ou manipulação de medicamentos;
Art. 2.º – No exercício profissional previsto no artigo anterior, poderá o farmacêutico executar a intercambialidade terapêutica e a substituição genérica;
Art. 3.º – Quando do ato de dispensação, poderá o farmacêutico orientar o paciente, e atendendo seus interesses, efetuar a substituição do medicamento prescrito, observando o princípio ativo, baseando-se na Denominação Comum Brasileira – DCB e, na sua falta, na Denominação Comum Internacional – DCI, a forma farmacêutica e a concentração do medicamento respectivo;
Resolução CFF nº 724, de 29 de abril de 2022 – Código de Ética – Seção I
Art. 12 – É direito do farmacêutico:
IX – realizar a intercambialidade de medicamentos, respeitando a decisão do usuário, dentro dos limites legais, e documentando o ato;
Fonte: CRF-SP. Acesso em: 24/03/2025.