Blog Farmácia Postado no dia: 28 outubro, 2021

CRF-SP e Cremesp se posicionam sobre teleatendimento médico nas farmácias

O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) e o Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo (CRF-SP) vêm a público expor a preocupação de ambas as entidades com aspectos éticos e legais a envolverem a prática da telemedicina realizada dentro de farmácias.
Essa proposta não possui regulamentação e necessita ser amplamente debatida, pois pode vir a caracterizar infração ao artigo 55 da Lei Federal nº 5.991/73(http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5991.htm) e ao artigo 16, alínea “g”, do Decreto Federal nº 20.931/32 (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1930-1949/d20931.htm).

Ambas as entidades são favoráveis à facilitação do acesso a serviços de saúde, porém, com limites definidos, segurança ao paciente, sem prejuízos a nenhuma das partes e com integral respeito à legislação em vigor

Lei Federal nº 5.991/73
Art. 55 – É vedado utilizar qualquer dependência da farmácia ou da drogaria como consultório, ou outro fim diverso do licenciamento.
Decreto Federal nº 20.931/3
Art. 16 É vedado ao médico:
g) fazer parte, quando exerça a clínica, de empresa que explore a indústria farmacêutica ou seu comércio. Aos médicos autores de fórmulas de especialidades farmacêuticas, serão, porém, assegurados os respectivos direitos, embora não as possam explorar comercialmente, desde que exerçam a clínica;

Durante a pandemia da covid-19, mostrou-se inquestionável a importância da tecnologia na área da saúde e nos diversos outros segmentos. Entretanto, as inovações demandam cuidadosa avaliação, a fim de que a saúde da população não seja exposta a riscos desnecessários.

Para o CRF-SP, um dos pontos que merece ampla discussão são as questões éticas, sem esquecer os direitos previstos no Código de Defesa do Consumidor, que garante, por exemplo, o direito de escolha do paciente que necessita comprar medicamentos e que pode, até mesmo, se sentir constrangido de procurar outros estabelecimentos farmacêuticos, caso receba uma prescrição por meio de um teleatendimento médico efetuado dentro de uma determinada farmácia.

O Código de Ética Farmacêutica, aprovado pela Resolução nº 711/21 (https://www.in.gov.br/web/dou/-/resolucao-n-711-de-30-julho-de-2021-337525053) do Conselho Federal de Farmácia (CFF) também traz dispositivos que, em tese, poderão ser desrespeitados com a prática na telemedicina na farmácia:

Art. 18 – É proibido a todos os inscritos no CRF:
XXII – exercer atividade no âmbito da profissão farmacêutica em interação com outros profissionais, concedendo vantagem de qualquer natureza aos demais profissionais habilitados para o direcionamento de usuário, ferindo o direito deste de escolher livremente o serviço e o profissional;
XXIV – submeter-se a fins meramente mercantilistas que venham a comprometer o seu desempenho técnico, em prejuízo da sua atividade profissional;

O Cremesp destaca a necessidade de serem elucidados os critérios para a seleção dos médicos que prestarão o atendimento virtual, a forma de verificação da habilitação legal profissional e como serão realizados o acompanhamento e a análise de possíveis exames. Outro ponto a ser observado é a realização da consulta, ou seja, de que maneira o médico irá ‘examinar’ o paciente.

A propósito, o Código de Ética Médica (Res. CFM nº 1.931/09) estabelece, como regra geral, a proibição da prescrição de tratamento sem exame direto do paciente (art. 37), além de vedar o exercício da medicina com interação ou dependência de farmácia ou indústria farmacêutica e censurar a percepção de vantagem pela comercialização de medicamentos ou encaminhamento de procedimentos (arts. 68 e 69).

A partir dessas normas deontológicas, o Conselho Federal de Medicina (CFM) emitiu o Parecer nº 09/2009, no qual acentua que “a atividade médica deve ser totalmente desvinculada da prática farmacêutica, sendo a vinculação entre o médico e o estabelecimento de dispensa de medicamento atitude deontologicamente reprovável, salvo em caso onde o profissional não exerça a medicina” (https://sistemas.cfm.org.br/normas/arquivos/pareceres/BR/2009/9_2009.pdf).

Tais pontos deverão ser esclarecidos para que, a partir do desempenho técnico e moral da medicina, prevaleçam as melhores práticas profissionais.

Além dessas perguntas, diversas outras ainda seguem sem respostas quando o assunto é a telemedicina em estabelecimentos farmacêuticos:
* Em caso de solicitação de exames clínicos, o paciente conseguirá passar por retorno com o mesmo médico solicitante?
* Haverá um prontuário médico que possa ser acessado por outros profissionais?
* Em caso positivo, como será guardado o prontuário?
* Serão observados os princípios da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD)?
* Como o paciente fará para saber quem é o médico especialista que o está atendendo e se está inscrito em seu Conselho de Classe?
* Qual preocupação que esse modelo de consulta médica tem com o vínculo entre médico e paciente, um importante pilar para o sucesso do tratamento?
* Em caso de erro, quem será responsabilizado?
* Qual será o papel do farmacêutico? Como esse profissional desenvolverá suas atribuições clínicas?
* Como será a remuneração dos profissionais envolvidos?
* Que tipo de vínculo se estabelece?

Diante do exposto, ambas as entidades reiteram que são favoráveis à facilitação do acesso a serviços de saúde, porém, com limites definidos, segurança ao paciente, sem prejuízos a nenhuma das partes e com integral respeito à legislação em vigor.