O artigo 196 da Constituição estabelece que a saúde é direito de todos e dever do Estado “garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.”
Por sua vez, o artigo 197 dispõe que “são de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle(…)”.
Ou seja, o direito à saúde é garantido de acordo com as políticas públicas que forem estabelecidas para tanto, o que já é um limitador. Ao garantir o acesso universal para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a Constituição deixa claro que isso ocorrerá mediante políticas sociais e econômicas (art. 196), considerando-se como de relevância pública aquilo que estiver regulado por lei (art. 197).
A Lei n.º 8.080/90, por sua vez, dispõe que a integralidade de assistência é constituída por um conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema (art. 7º, II) e estabelece que a assistência terapêutica integral consistirá na “I — dispensação de medicamentos e produtos de interesse para a saúde, cuja prescrição esteja em conformidade com as diretrizes terapêuticas definidas em protocolo clínico para a doença ou o agravo à saúde a ser tratado, ou, na falta do protocolo, em conformidade com o disposto no art. 19-P” (art. 19-M).
Dessa forma, ainda que se entenda que em um caso concreto seja possível obrigar o Estado, em sentido amplo, a oferecer serviços e prestações que não estão instituídos em políticas públicas, não há como se entender que integralidade é acesso irrestrito a tudo, inclusive àquelas opções de tratamento que não importam em maior efetividade, mas somente comodidade, dar a todos o tratamento de ponta e a melhor tecnologia, mas sim dar a todos os pacientes uma resposta satisfatória em todos os níveis de atenção.
Os requisitos para a concessão de medicamentos pelas políticas públicas foram elencados pelo STF, sendo eles:
1. A ausência de inclusão de medicamentos nas listas de dispensação do Sistema Único de Saúde — SUS (RENAME, RESME, REMUNE, entre outras) impede, como regra geral, o fornecimento do fármaco por decisão judicial, independentemente do custo.
2. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de Saúde, desde que preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos, cujo ônus probatório incumbe ao autor da ação:
(a) negativa de fornecimento de medicamentos na via administrativa, nos termos do item “4” do Tema 1.234 da repercussão geral;
(b) ilegalidade do ato de não incorporação do medicamento pela Conitec, ausência de pedido de incorporação ou da mora na sua apreciação, tendo em vista os prazos e critérios previstos nos artigos 19-Q e 19-R da Lei n.° 8.080/1990 e no Decreto n.° 7.646/2011;
(c) impossibilidade de substituição por outro medicamento constante das listas do SUS e dos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas;
(d) comprovação, à luz da medicina baseada em evidências, da eficácia, acurácia, efetividade e segurança do fármaco, necessariamente respaldadas por evidências científicas de alto nível, ou seja, unicamente ensaios clínicos randomizados e revisão sistemática ou meta-análise;
(e) imprescindibilidade clínica do tratamento, comprovada mediante laudo técnico fundamentado, descrevendo inclusive qual o tratamento já realizado; e
(f) incapacidade financeira de arcar com o custeio do medicamento.
Faz-se necessário tão somente esclarecer que o requisito do registro na ANVISA afasta a possibilidade de fornecimento de medicamentos para uso off label, salvo caso autorizado pela ANVISA.
Além disso, é imprescindível apresentar todos os documentos de acompanhamento médico, como prontuário completo, relatórios médicos e as prescrições.
Assim, preenchendo todos os requisitos citados, aumenta muito a probabilidade de êxito de uma autorização judicial para o fornecimento de medicamentos pelo Estado.
Flávio Mendes Benincasa
OAB/PR 32.967, OAB/SP 166.766, OAB/MG 164.652, OAB/RJ 223.449, OAB/DF 61.671, OAB/MS 29.802-A, OAB/GO 68172 e OAB/CE 50168-A.
Curitiba-PR, 14 de novembro de 2024.