Blog Farmácia Postado no dia: 15 fevereiro, 2024

Multa e dupla fiscalização em farmácias

A aplicação de multas por órgãos administrativos em microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP) é uma prática delicada, dada a sua relevância para a estabilidade econômica desses empreendimentos. O Artigo 55 da Lei Complementar Federal n.º 123/06 estabelece a necessidade de uma dupla fiscalização antes da imposição de penalidades, reforçando a importância de garantir justiça e equidade no cumprimento das obrigações fiscais por parte dessas empresas.

O referido artigo reconhece as particularidades das MEs e EPPs, incluindo-se nisso a maioria das farmácias de manipulação, destacando que essas empresas muitas vezes operam com recursos limitados. A dupla fiscalização, nesse contexto, desempenha um papel crucial ao permitir uma revisão mais cuidadosa das situações, possibilitando a identificação de equívocos e a correção de possíveis irregularidades antes da aplicação de multas, alinhando-se assim com os princípios de proporcionalidade e razoabilidade estabelecidos pela legislação.

A proporcionalidade das multas também é enfatizada no Artigo 55. A dupla fiscalização oferece uma oportunidade para a administração e os órgãos fiscalizadores reavaliarem a adequação das penalidades à gravidade da infração cometida. Isso assegura que as multas sejam proporcionais e não representem um ônus excessivo para as MEs e EPPs, preservando, assim, a sua saúde financeira e incentivando a continuidade de suas atividades. Ademais, a legislação busca evitar abusos e interpretações arbitrárias por parte dos fiscais.

A dupla fiscalização, nesse sentido, atua como um mecanismo de controle interno, mitigando a possibilidade de decisões precipitadas ou baseadas em interpretações subjetivas, em conformidade com os princípios da transparência e da impessoalidade previstos na Lei Complementar Federal n.º 123/06.

O Artigo 55 também se alinha com a promoção de uma cultura de cooperação entre as partes envolvidas. A revisão dupla não apenas garante a justiça nas relações entre a administração e as MEs/EPPs, mas também incentiva um diálogo colaborativo. Essa abordagem proativa contribui para a correção voluntária de possíveis equívocos pelas empresas, antes que se tornem motivo para a imposição de penalidades, fortalecendo, assim, a relação entre o setor público e privado.

Em síntese, a dupla fiscalização, respaldada pelo Artigo 55 da Lei Complementar Federal n.º 123/06, desempenha um papel essencial na garantia da justiça e da proporcionalidade na aplicação de multas em empresas ME e EPP. Ao considerar as disposições legais específicas para essas categorias de empreendimentos, a legislação fortalece não apenas a proteção das MEs e EPPs, mas também a integridade e a estabilidade do ambiente de negócios como um todo.

E QUAL O POSICIONAMENTO DO JUDICIÁRIO SOBRE O ASSUNTO?

Assim como descrito em lei, os tribunais têm entendido como NULAS as multas aplicadas em estabelecimentos que não passaram por visita orientativa antes da aplicação de multa. Neste sentido, entendeu tanto o Tribunal de Justiça do Paraná, quanto o Tribunal Regional do Trabalho, veja:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. MICROEMPRESA. CRITÉRIO DA DUPLA VISITA, PREVISTO NA LC 123/2006. IMPEDIMENTO DE AUTUAÇÃO DIRETA. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO QUANTO À EXISTÊNCIA DE GRAU DE RISCO INCOMPATÍVEL. MULTA NULA. a) A Lei Complementar Federal n.º 123/06 já previa — à época da lavratura do Auto de Infração — como prerrogativa para as microempresas e empresas de pequeno porte, o critério da dupla visita, que impossibilita a lavratura imediata do Auto de Infração, caso detectada alguma irregularidade, devendo, antes, existir orientação para cessar a atividade ou situação incompatível com o ordenamento. b) A norma não previa apenas a dupla visita para a fiscalização no aspecto trabalhista, mas, também, ambiental, sendo alterada em 2014 (pela Lei Complementar n.º 147) para inserir, também, a fiscalização de uso e ocupação do solo como hipótese que impede a autuação direta. c) Ademais, em pese a norma restrinja a aplicação do critério da dupla visita “quando a atividade ou situação, por sua natureza, comportar grau de risco compatível com esse procedimento”, não há nenhuma motivação no Auto de Infração nesse sentido. d) Desse modo, a Empresa não podia ser diretamente autuada, sem, antes, receber uma visita orientativa sobre a regularização da situação desconforme, a qual não foi demonstrada nos autos, sendo o Auto de Infração nulo.

TJ-PR-ED: 00027493320188160100 Jaguariaíva 0002749-33.2018.8.16.0100 (Acórdão), Relator: Leonel Cunha, Data de Julgamento: 13/10/2021, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: 14/10/2021;

AÇÃO ANULATÓRIA. AUTOS DE INFRAÇÃO. EMPRESA DE PEQUENO PORTE. CRITÉRIO DA DUPLA VISITA NÃO OBSERVADO. NULIDADE. O critério que determina a necessidade da dupla visita não é o grau de risco da atividade, mas sim o enquadramento da empresa como de pequeno porte (caso dos autos). Portanto, ainda que a atividade da empresa seja grau de risco 3, este fato não é preponderante a autorizar o descumprimento da norma. Desta forma entendo não cumprido o critério legal, o que torna nulos os autos de infração.
(TRT-16 00164776520195160001, Relator: JAMES MAGNO ARAUJO FARIAS, Data de Publicação: 22/09/2022

QUANDO MENCIONAR SOBRE A VISITA ORIENTATIVA?

Em caso de autuação, o estabelecimento deve verificar se houve a visita orientativa, antes da aplicação de qualquer penalidade, podendo ser arguida a nulidade da autuação, por profissional especializado no assunto.

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Curitiba, 15 de fevereiro de 2024.

Isabele B. Cruz, OAB/PR 110.758.