Blog Farmácia Postado no dia: 16 abril, 2024

Plano de saúde é obrigado a fornecer cannabis medicinal para uso em ambiente domiciliar

Havendo expressa indicação médica para a realização do tratamento com medicação oncológica, não pode a operadora se recusar à cobertura sob o fundamento de exclusão contratual, colocando o consumidor em excessiva desvantagem (art. 51, IV, do CDC). Isso porque, se a operadora se obrigou a tratar da saúde do consumidor, não pode agora se furtar de cobrir a medicação, pois estaria se recusando a cumprir a própria obrigação assumida.

Vale destacar que não é incumbência do conveniado ou do plano escolher a forma de tratamento, e sim do profissional de saúde, a quem compete prescrever a terapia adequada aos cuidados de seu paciente, ressalvada a expressa e premente necessidade do autor, diante do crítico quadro clínico com potencial risco de morte.

Foi o que entendeu a 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em 11 de abril de 2024. De maneira unânime, a corte decidiu em favor do conveniado, que solicitava medicamento a base se cannabis, conforme prescrição médica.

A decisão esclareceu que o plano de saúde contratado tem por escopo a disponibilização de serviços para a preservação/recuperação da saúde do autor e para tanto deve abranger todos os meios disponíveis na medicina. E que é da responsabilidade dos médicos que acompanham o paciente a orientação terapêutica, não cabendo à operadora negar a cobertura, sob pena de colocar em risco a saúde da paciente.

O entendimento do Tribunal Paulista mostra que é irrelevante que a ANS não tenha ainda catalogado o medicamente ou o tratamento ministrado ao paciente pelo médico que o assiste. Entre a aceitação da comunidade científica e os demorados trâmites administrativos de classificação, não pode o paciente permanecer a descoberto, colocando em risco bens existenciais. Evidente que não pode um catálogo de natureza administrativa contemplar todos os avanços da ciência, muito menos esgotar todas as moléstias e seus meios curativos usados pela comunidade médica com base científica.

A Lei n.º 14.454/22 introduziu o § 13 no art. 10 da Lei n.º 9.656/98, de acordo com o qual é possível a cobertura de procedimentos em princípio não previstos no rol da ANS desde que haja prescrição médica, que exista comprovação da eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico ou que existam recomendações pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), ou exista recomendação de, no mínimo, 1 (um) órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional, desde que sejam aprovadas também para seus nacionais.

Assim, não há mais que se falar que o rol da ANS é de taxatividade absoluta, cabendo aos planos de saúde comprovar, para os procedimentos que em princípio nele não estão incluídos, que não estão preenchidos os requisitos acima reproduzidos. Assim, não há como se esquivar da conclusão de que a negativa de cobertura equivaleria à própria negativa de tratamento com o medicamento a base de cannabis.

 

Curitiba-PR, 16 de abril de 2024.

Flávio Mendes Benincasa
OAB/PR 32.967, OAB/SP 166.766, OAB/MG 164.652, OAB/RJ 223.449, OAB/DF 61.671, OAB/MS 29.802-A, OAB/GO 68172 e OAB/CE 50168-A