Blog Farmácia Postado no dia: 21 outubro, 2022

Vedação do conselho federal de medicina ao tratamento adequado com o canabidiol.

Dia 14 de outubro de 2022 foi publicada Resolução 2324/2022 onde o CFM limita a prescrição do canabidiol para o tratamento de epilepsias da criança e do adolescente às terapias convencionais na Síndrome de Dravet e Lennox-Gastaut e no Complexo de Esclerose Tuberosa.

A Resolução ainda proíbe os médicos de ministrar palestras e cursos do uso do canabidiol e/ou produtos derivados de Cannabis fora do ambiente científico.

A resolução elenca para quais enfermidades o medicamento pode ser utilizado e censura os médicos de compartilharem o conhecimento adquirido com o tratamento utilizando o Canabidiol, indo de encontro inclusive com a permissão dos medicamentos off label.

É considerado on label a prescrição que observa estritamente as indicações e recomendações clínicas constantes da bula aprovada, no ato de registro do medicamento, pela Anvisa. Em sentido diametralmente oposto, entende-se por prescrição off label aquela que é realizada pelo médico em situações opostas às recomendações do fabricante indicadas no relatório técnico.

Paralelamente às formas on e off label, existe ainda a possibilidade de uma nova forma de prescrição denominada silent label, isto é: “[…] verdadeiro espaço para a eventual atuação médica com relação a um medicamento, sobre o qual a agência reguladora não se pronunciou acerca da segurança e eficácia, sem, contudo, jamais tê-la rechaçado, exatamente por inexistirem estudos tanto para o registro quanto para sua negativa ou alteração, em propósito alheio à bula.”

No que se refere propriamente à juridicidade da prática médica consistente na prescrição off ou silent label, salvo engano, é a primeira Resolução do CFM que veda expressamente as referidas práticas no contexto nacional.

A prescrição de medicamentos offlabel tem aprovação da própria Anvisa, que declara:

“Uma vez comercializado o medicamento, enquanto as novas indicações não são aprovadas, seja porque as evidências para tal ainda não estão completas, ou porque a agência reguladora ainda as está avaliando, é possível que um médico já queira prescrever o medicamento para um seu paciente que tenha uma delas. Podem também ocorrer situações de um médico querer tratar pacientes que tenham uma certa condição que, por analogia com outra semelhante, ou por base fisiopatológica, ele acredite possam vir a se beneficiar de um determinado medicamento não aprovado para ela.

(…)

…”  O uso off label de um medicamento é feito por conta e risco do médico que o prescreve, e pode eventualmente vir a caracterizar um erro médico, mas em grande parte das vezes trata-se de uso essencialmente correto, apenas ainda não aprovado.

…”

O STJ, através do julgamento do Recurso Especial 1.721.705/SP, entende que o emprego de medicamento registrado na Anvisa para finalidades terapêuticas diversas daquelas indicadas na bula, prescrição off label, constitui prática lícita.

Apesar do Brasil estar engatinhando no tratamento com o Canabidiol, outros Países já utilizam o medicamento há muito tempo, inclusive a ONU já reclassificou a Cannabis para a lista das que têm propriedades medicinais reconhecidas, embora devam ser controladas.

Tal evolução pôde ser verificada na Olimpíada de Tóquio foi a primeira na qual o CBD constou como substância liberada para uso pelos atletas, ao mesmo tempo em que punições mais brandas são previstas para o uso do tetrahidrocanabinol (THC), canabinoide com efeitos psicoativos, também extraído da Cannabis, mas proibido pela Wada, a agência internacional antidoping.

A vedação da prescrição do Cannabidiol para outras enfermidades, que não sejam as listadas pelo CRM, vai de encontro ao Código de Ética Médica, pois o médico deixará de usar todos os meios disponíveis de tratamento, cientificamente reconhecidos e a seu alcance, em favor do paciente.

Importante lembrar ainda que não estamos tratando de uma droga alucinógena e sim de um medicamentos essencial para o tratamento de diversas enfermidades, que são prescritas de forma responsável pelo profissional médico, que utilizam inclusive estudos e comprovações científicas internacionais para o melhor tratamento do paciente.

O CRM mostra um posicionamento retrogrado, mas os médicos não podem aceitar passivamente essa restrição, devendo cobrar resposta do Conselho Federal de Medicina, os reais motivos da limitação, inclusive da censura imposta aos médicos em compartilhar os seus conhecimentos técnicos em relação a este medicamento.

 

Artigo 18/10/2022

Dr. Flávio Benincasa

OAB/PR 32.967, OAB/SP 166.766, OAB/MG 164.652, OAB/RJ 223.449 e OAB/DF 61.671

——————————————————————————————————————————————————————————–

1 NOGUEIRA, Roberto Henrique Pôrto. Prescrição off label de medicamentos, ilicitude e responsabilidade civil do médico. Belo Horizonte: Ed. PUC Minas, 2017. p. 68.