Havendo expressa indicação médica para a realização do tratamento com medicação oncológica, não pode a operadora se recusar à cobertura sob o fundamento de exclusão contratual, colocando o consumidor em excessiva desvantagem (art. 51, IV, do CDC). Isso porque, se a operadora se obrigou a tratar da saúde do consumidor, não pode agora se furtar de cobrir a medicação, pois estaria se recusando a cumprir a própria obrigação assumida.
Vale destacar que não é incumbência do conveniado ou do plano escolher a forma de tratamento, e sim do profissional de saúde, a quem compete prescrever a terapia adequada aos cuidados de seu paciente, ressalvada a expressa e premente necessidade do autor, diante do crítico quadro clínico com potencial risco de morte.
Foi o que entendeu a 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em 12 de março de 2024. De maneira unânime, a corte decidiu em favor do conveniado, que solicitava medicamento a base de cannabis, que já era autorizado pela Anvisa para importação em situações excepcionais.
No que concerne à discussão acerca da taxatividade do rol de procedimentos da ANS, a recente alteração da Lei n. 9.656/98, pela Lei n. 14.454/2022, acabou por dissipá-la, ao dispor que o rol constitui apenas referência básica para os planos privados de assistência à saúde e que, em caso de tratamento ou procedimento prescrito por médico ou odontólogo assistente que não estejam previstos no rol, a cobertura deverá ser autorizada pelo plano, desde que exista comprovação da eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico; ou existam recomendações pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), ou exista recomendação de, no mínimo, 1 (um) órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional, desde que sejam aprovadas também para seus nacionais.
No caso concreto, a eficácia do medicamento estaria amparada no relatório médico, cuja presunção não foi afastada por qualquer prova em sentido contrário, bem como não houve indicação pelo plano de saúde de outro método igualmente efetivo e menos custoso, inviável a definição do caso.
OS Desembargadores levaram em conta que não havia nenhuma cláusula contratual que excluísse a cobertura para a doença, razão pela qual as disposições contratuais deveriam ser interpretadas de modo mais benéfico ao conveniado. Assim, não há como se esquivar da conclusão de que a negativa de cobertura equivaleria à própria negativa de tratamento.
Curitiba-PR, 18 de março de 2023
Flávio Mendes Benincasa
OAB/PR 32.967, OAB/SP 166.766, OAB/MG 164.652, OAB/RJ 223.449, OAB/DF 61.671, OAB/MS 29.802-A, OAB/GO 68172 e OAB/CE 50168-A